Jejum intermitente… a estratégia revolucionária para perda de peso?

AE VS jejum intermitente | Auchan&Eu

Há vários anos que se tenta descobrir qual a melhor estratégia para a perda de peso. Mas por que é que temos de rotular a melhor estratégia? Atualmente, existem imensas metodologias para o mesmo fim, que se adequam às necessidades individuais de cada um. Sendo que nos devemos focar na adoção de uma estratégia que seja duradoura, que promova resultados a longo prazo e que assegure a saúde e o bem-estar individual.

O jejum intermitente tem vindo a ser uma opção cada vez mais utilizada para perda de peso e, supostamente, para melhorias em saúde.

Tal como a dieta paleo, o jejum intermitente assenta nos hábitos dos nossos antepassados, além de ser bastante comum por razões religiosas, incluíndo no Ramadão. Todavia, não significa que o jejum intermitente seja válido somente pela sua antiguidade. Aliás, se percepcionamos os hábitos de estilo de vida dos nossos antepassados, sabemos que, além de passarem bastante tempo em jejum, também praticavam atividade física permanentemente.

Portanto, provavelmente seria essa junção que potenciou um estilo de vida saudável, com valores redutores de obesidade e excesso de peso.

Mas afinal o que é o jejum intermitente?

Consiste numa estratégia alimentar, que tem por base um período de jejum prolongado, seguido de um curto período de consumo alimentar, que tem como principal objetivo reduzir o valor energético total, através de um balanço energético negativo, que resultará em perda de peso.

O jejum intermitente não segue os padrões de uma dieta convencional, no sentido em que não define a tipologia dos alimentos ingeridos, mas orienta para o período da sua ingestão. Durante o jejum poderão ser ingeridos líquidos sem valor energético (água, café e chá) enquanto que, durante o período de alimentação não há qualquer limitação1,2.

O jejum intermitente consiste essencialmente em três métodos:

  • 16/8 ou 20/4: jejuar durante 16 a 20 horas seguidas e consumir alimentos num período de 8 a 4 horas. Normalmente, é o método mais usual, visto ser o mais fácil de executar, dado que durante o sono limitamos de forma inata a ingestão de alimentos sem que isso constitua uma dificuldade, sendo que prolongar essa limitação é o processo mais comum dos praticantes.
  • 5/2: jejuar em dois dias não consecutivos durante a semana, com restrição limitada até 600 kcal/ dia e realizar o consumo alimentar sem restrições nos restantes cinco dias da semana.
  • Eat-Stop-Eat: jejuar durante 24 horas, em um a dois dias por semana (em dias alternados). Portanto, jejuar entre uma refeição de um dia e a mesma refeição do dia seguinte2,3,4.

O que existe na evidência científica?

Esta estratégia alimentar tem vindo a ser bastante controversa, dada à evidência científica atual ser bastante limitada, já que a maioria dos estudos foram realizados em animais, e dessa forma, não poderemos diretamente aplicar essas conclusões em Humanos, visto que o ato de comer para um animal é um ato meramente biológico, enquanto que para o Humano traduz-se num ato biológico e social5.

Além de que é realmente uma estratégia bastante exigente e difícil de cumprir, portanto, deverá ser sempre estruturada e acompanhada por um profissional de saúde. Se assim não for, poderá acarretar consequências como fraqueza muscular, cansaço, alterações de humor, irritabilidade, desidratação e até carências nutricionais, devido aos longos períodos de jejum.

Nesse sentido, serão necessários mais estudos a longo prazo com uma amostra considerável em Humanos, para ser possível perceber a sua aplicação em vários grupos de risco. Portanto, até lá, por precaução, não deverá ser aplicado em grávidas, indivíduos com baixo peso e com historial de doenças de comportamento alimentar, dados os longos períodos de jejum, seguidos de períodos de consumo alimentar, que poderão estar associados a um episódio compulsivo de binge eating, isto é, comer de forma descontrolada1,6.

Portanto, mesmo que o princípio do jejum intermitente não seja limitar a tipologia de alimentos, no período de alimentação, deve optar por alimentos ricos em proteína de alto valor biológico (carne, peixe, ovos…), frutas e legumes, além de alimentos ricos em hidratos de carbono de absorção lenta (arroz, batata…).

Apresenta benefícios para a saúde?

Numa larga pesquisa consegue-se identificar que grande parte dos artigos científicos concluem sempre da mesma forma: serão necessários mais estudos, a longo prazo, numa amostra humana, para tirar mais conclusões.

O jejum intermitente, quando comparado com uma dieta mais usual, de restrição calórica contínua, na qual se realizam várias refeições ao longo dia, é equivalente em relação à perda de peso e massa gorda, e não apresenta de forma geral, diferenças significativas na glicémia, triglicerídeos, colesterol, leptina, adiponectina e proteína C-reativa (marcador da inflamação). Tendencialmente, verifica-se apenas uma melhoria no que diz respeito à sensibilidade à insulina, o que poderá ser importante principalmente em doentes diabéticos tipo 2 e obesos7-9.

A Diabetes Mellitus tipo 2 é, de facto, reversível quando existe perda de peso, principalmente acumulada na zona abdominal, seja através de dieta ou cirurgia bariátrica. Segundo os estudos científicos, não se verificaram diferenças nos diabéticos que adotaram a dieta de restrição calórica diária e de jejum intermitente. Portanto, fica ao critério do diabético, em junção com o seu médico e/ou nutricionista optar pela estratégia mais adequada, de forma a evitar possíveis hipoglicémias10.

Relativamente aos atletas ou indivíduos fisicamente ativos, jejuar não é o melhor método para preservar a massa muscular, principalmente durante um período de provas desafiantes. No entanto, o catabolismo proteico parece ser controlado, mantendo a massa magra e até promovendo perda de massa gorda, através da prática de exercício físico de resistência, em atletas durante o Ramadão. No entanto, mais estudos serão necessários11.

Resumindo, atualmente, não se pode afirmar que o jejum intermitente é uma estratégia revolucionária, nem superior à dieta restritiva contínua. Faz sentido que a escolha da estratégia para perda de peso seja adotada, com base nos hábitos de estilo de vida diários e nas necessidades individuais de cada indivíduo, preferencialmente acompanhado por um nutricionista. Além disso, o que importa para perder peso e massa gorda é a adesão à dieta e não a dieta em si, ou seja, o que realmente importa é a adoção de um balanço energético negativo diário, seja através de uma ou seis refeições12,13.

Relativamente à relação do jejum intermitente com as patologias crónicas (doenças cardiovasculares, cancro, etc.), ainda não se consegue afirmar que existem benefícios realistas, visto serem necessários mais estudos de longo prazo em humanos, com amostras significativas para tirar conclusões definitivas.

Referências bibliográficas:
  1. Malinowski, B., Zalewska, K., Węsierska, A., Sokołowska, M. M., Socha, M., Liczner, G., Wiciński, M. (2019). Intermittent Fasting in Cardiovascular Disorders—An Overview. Nutrients, 11(3), 673
  2. Stockman, M. C., Thomas, D., Burke, J., & Apovian, C. M. (2018). Intermittent Fasting: Is the Wait Worth the Weight? Current Obesity Reports, 7(2), 172–185.
  3. Obert, J., Pearlman, M., Obert, L., & Chapin, S. (2017). Popular Weight Loss Strategies: a Review of Four Weight Loss Techniques. Current Gastroenterology Reports, 19(12), 17–20
  4. Mattson MP, Longo VD, Harvie M. Impacto do jejum intermitente nos processos de saúde e doença. Aging Res Rev. 2017; 39 : 46–58. doi: 10.1016 / j.arr.2016.10.005.
  5. Welton S, Minty R, O’Driscoll T, Willms H, Poirier D, Madden S, Kelly L. Intermittent fasting and weight loss: Systematic review. Can Fam Physician. 2020 Feb;66(2):117-125. PMID: 32060194; PMCID: PMC7021351.
  6. Aksungar FB, Sarikaya M, Coskun A, Serteser M, Unsal I. Comparison of intermittent fasting versus caloric restriction in obese subjects: A two year follow-up. J Nutr Health Aging. 2017;21(6):681-685. doi:10.1007/s12603-016-0786-y
  7. Patterson RE, Sears DD. Metabolic Effects of Intermittent Fasting. Annu Rev Nutr. 2017 Aug 21;37:371-393. doi: 10.1146/annurev-nutr-071816-064634. Epub 2017 Jul 17. PMID: 28715993.
  8. Harvie, M N et al. “The effects of intermittent or continuous energy restriction on weight loss and metabolic disease risk markers: a randomized trial in young overweight women.” International journal of obesity (2005) vol. 35,5 (2011): 714-27. doi:10.1038/ijo.2010.171
  9. Headland M, Clifton PM, Carter S, Keogh JB. Weight-Loss Outcomes: A Systematic Review and Meta-Analysis of Intermittent Energy Restriction Trials Lasting a Minimum of 6 Months. Nutrients. 2016 Jun 8;8(6):354. doi: 10.3390/nu8060354. PMID: 27338458; PMCID: PMC4924195.
  10. Barnosky AR, Hoddy KK, Unterman TG, Varady KA. Intermittent fasting vs daily calorie restriction for type 2 diabetes prevention: a review of human findings. Transl Res. 2014 Oct;164(4):302-11. doi: 10.1016/j.trsl.2014.05.013. Epub 2014 Jun 12. PMID: 24993615.
  11. Keenan S, Cooke MB, Belski R. The Effects of Intermittent Fasting Combined with Resistance Training on Lean Body Mass: A Systematic Review of Human Studies. Nutrients. 2020 Aug 6;12(8):2349. doi: 10.3390/nu12082349. PMID: 32781538; PMCID: PMC7468742.
  12. Lowe DA, Wu N, Rohdin-Bibby L, et al. Effects of Time-Restricted Eating on Weight Loss and Other Metabolic Parameters in Women and Men With Overweight and Obesity: The TREAT Randomized Clinical Trial. JAMA Intern Med. 2020;180(11):1491–1499. doi:10.1001/jamainternmed.2020.4153

Daniela Cação, Nutricionista Auchan
Membro da Ordem dos Nutricionistas, nº4295N